Na última quinta-feira (3/7), por meio da edição das Resoluções nº 231 e 232, a CVM anunciou a criação do novo Regime FÁCIL (acrônimo de Facilitação do Acesso a Capital e de Incentivos a Listagens), cujo objetivo maior consiste em democratizar o ingresso de companhias de menor porte como tomadoras de recursos no mercado de capitais brasileiro. A vigência das novas disposições está prevista para o dia 2 de janeiro de 2026.
O Regime FÁCIL tem como alvo empresas cujo faturamento bruto anual não ultrapasse o montante de 500 milhões de reais (as chamadas Companhias de Menor Porte ou apenas “CMP”), que poderão acessar os investidores do mercado doméstico a um custo regulatório reduzido, se beneficiando de obrigações menos onerosas e proporcionalmente adaptadas à realidade dessas companhias. Nesse sentido, destaca-se o seguinte:
- Formulário FÁCIL: se trata de documento único e simplificado, que deverá ser apresentado pela CMP anualmente, em substituição ao formulário de referência exigido dos demais emissores registrados na CVM. O Formulário FÁCIL também deverá ser atualizado eventualmente, de acordo com os requisitos da RCVM 232, e funcionará como um material de divulgação de oferta pública, substituindo o prospecto e a lâmina, nos casos em que forem exigidos.
- DFs Semestrais: as CMP apresentarão as demonstrações financeiras exigidas em periodicidade semestral, utilizando formulários próprios (ISEM) e não precisarão apresentar os Formulários de Informações Trimestrais (ITR) tal qual os demais emissores, sem prejuízo, porém, da necessária manutenção de canais de comunicação contínua e transparente com o mercado.
- Assembleias Remotas: as CMP ficarão dispensadas do cumprimento de parte das regras e procedimentos aplicáveis à convocação, instalação e realização de assembleias de acionistas, debenturistas e titulares de notas promissórias e notas comerciais, previstos na Resolução CVM 81. Em particular, as CMP não ficarão obrigadas a permitir a exercício do voto à distância nessas assembleias, por meio do preenchimento e entrega do boletim de voto, tampouco a realizar assembleias de modo parcial ou exclusivamente digital (embora possam fazê-lo, mediante o cumprimento dos normativos aplicáveis).
- Relatório ESG: o Regime FÁCIL exime as CMP da apresentação obrigatória de relatórios de informações financeiras relacionadas à sustentabilidade nos moldes da Resolução CVM 193, facultando-lhes, contudo, a adoção voluntária de práticas ESG que melhor se adequem às suas estratégias de governança.
- OPA para Cancelamento de Registro: no caso das CMP, o quórum de sucesso da oferta pública de aquisição de ações para cancelamento de registro junto à CVM corresponderá a mais de metade das ações elegíveis (e não 2/3, como se aplica aos demais emissores).
Ademais, as CMP terão benefícios singulares para realizar captações de poupança popular por meio de ofertas públicas de valores mobiliários, desde que respeitado um teto de até 300 milhões de reais em cada período de doze meses. Notadamente, respeitado tal limite, as CMP poderão: (i) realizar as novas “ofertas diretas” – novo rito simplificado previsto na Resolução CVM 232 em que a oferta ocorre diretamente em mercado organizado, sem a necessidade de registro na CVM e de contratação de instituição para atuar como coordenador; (ii) realizar ofertas de dívida destinadas exclusivamente a investidores profissionais, com a dispensa de contratação de instituição para atuar como coordenador; e (iii) realizar ofertas destinadas ao público em geral, substituindo prospecto e lâmina pelo formulário FÁCIL.
Nada impedirá, ainda, que as CMP realizem ofertas de acordo com os ritos e requisitos da Resolução CVM 160, sem limitação de valor, desde que elaborem e disponibilizem o formulário de referência e informações contábeis trimestrais.
Ainda na temática das ofertas, a Resolução CVM 232 trouxe inovação relevante ao permitir que sociedades anônimas registradas na CVM (nem mesmo na categoria CMP) realizem ofertas de títulos de dívida destinadas a investidores profissionais, sem a necessidade de contratação de instituição para atuar como coordenador. Para tanto, as sociedades anônimas deverão estar enquadradas na condição de companhia de menor porte e observar o disposto no artigo 89, da Resolução CVM 160. A mesma benesse não foi concedida às sociedades limitadas, sem prejuízo da possibilidade de estas realizarem ofertas destinadas a investidores profissionais, por meio da contratação de instituições integrantes do sistema de distribuição de valores mobiliários, desde que cumpram o disposto no artigo 89 da Resolução CVM 160.
O processo de adesão de novos emissores ao regime FÁCIL será realizado de forma automática, por meio de sua listagem em qualquer entidade administradora de mercado organizado que adote o conjunto mínimo de documentos necessários previsto no Anexo A à Resolução CVM 232. Neste caso, o registro na CVM e a consequente classificação como CMP são obtidos de forma automática após a listagem. Já os emissores registrados nas categorias “A” e “B” CVM que se enquadrem nos limites de faturamento do FÁCIL deverão buscar a anuência de seus investidores para migrar para a categoria CMP, observados os quóruns e procedimentos estabelecidos na Resolução CVM 232.
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