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Dívidas condominiais e a possibilidade de penhora de imóveis alienados fiduciariamente

Dívidas condominiais e a possibilidade de penhora de imóveis alienados fiduciariamente

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) recentemente julgou o Recurso Especial nº 2.059.278, trazendo à tona um debate relevante sobre a possibilidade de penhora de imóveis alienados fiduciariamente para quitar despesas condominiais. O recurso se originou de um cumprimento de sentença movido por um condomínio residencial contra um condômino inadimplente em relação às despesas condominiais.

O condomínio recorrente interpôs um agravo de instrumento contra a decisão proferida pelo Juízo de Direito da 7ª Vara Cível da Comarca de Joinville/SC, que havia indeferido o pedido de penhora do apartamento, sob o fundamento de que o imóvel estava alienado fiduciariamente à Caixa Econômica Federal. O Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (“TJSC”), por sua vez, negou provimento ao agravo.

O condomínio recorrente, inconformado com o acórdão do TJSC, interpôs o recurso especial, alegando, dentre outros pontos, violação ao artigo 835, § 3º, do Código de Processo Civil (CPC/2015). Sustentou que, mesmo diante da alienação fiduciária, o imóvel gerador das despesas condominiais deveria ser penhorável, uma vez que essas dívidas possuem natureza propter rem. Afirmou, ainda, que em conformidade com a Súmula nº 478 do STJ, a garantia do débito condominial estaria assegurada pelo imóvel que o originou.

O voto vencido proferido pelo Relator, Ministro Marco Buzzi, considerou o debate em torno da possibilidade de penhora de bens alienados fiduciariamente para o pagamento de despesas condominiais. Ressaltou que a obrigação de pagar despesas condominiais é propter rem, o que significa ser uma obrigação vinculada ao próprio imóvel, e pode transitar entre direitos reais e pessoais.

O Ministro Relator argumentou que, em geral, as despesas condominiais de natureza propter rem permitem a penhora do próprio imóvel gerador das despesas para satisfazer o crédito do condomínio. No entanto, observou que a regra comporta exceções, principalmente quando o bem alienado fiduciariamente não integra o patrimônio do devedor fiduciante, uma vez que os atos executivos recaem somente sobre o patrimônio do devedor.

Já o voto vencedor, proferido pelo Ministro Raul Araújo, considerou que a jurisprudência do STJ determina que o credor, na execução de devedor condômino adquirente por meio de alienação fiduciária, possui o direito de penhorar apenas os direitos inerentes à posição do devedor fiduciário no contrato, sem alcançar o próprio imóvel. No entanto, ele apontou que essa solução é adequada quando o credor é um terceiro, não envolvido no contrato de alienação fiduciária.

Entretanto, destacou o Ministro Araújo que, quando o credor é o próprio condomínio, a situação é diferente, devido à natureza propter rem das despesas condominiais. O Ministro apontou que, de acordo com o artigo 1.345 do Código Civil de 2002, o adquirente de uma unidade condominial responde pelos débitos do alienante perante o condomínio, incluindo multas e juros moratórios.

O Ministro Raul Araújo enfatizou, ainda, que a interpretação de que o credor fiduciário, titular da propriedade resolúvel da coisa imóvel, possuiria direitos maiores que o proprietário comum, é equivocada e não sustentável. O Ministro argumentou que a Lei de Alienação Fiduciária e a legislação de locações mostram que a interpretação ampla dessas normas, que estendem as disposições da legislação especial a terceiros não contratantes, é incorreta.

O Ministro Raul Araújo defendeu, por fim, que o condomínio deve promover a citação do credor fiduciário para integrar a execução, permitindo que ele quite a dívida condominial e, em uma ação regressiva, obtenha o ressarcimento junto ao devedor fiduciante. Desta forma, evita-se que os demais condôminos arquem com a dívida resultante da inadimplência de um único condômino.

Por meio de seu voto vencedor, o Ministro concluiu, portanto, que a melhor solução seria integrar todas as partes na execução para encontrar a adequada solução, assegurando o pagamento das despesas condominiais e a preservação dos interesses da coletividade de credores.

Link: REsp 2.059.278-SC