PANORAMA SOCIETÁRIO

A OPA por aumento de participação como instrumento de proteção da liquidez

O início do ano de 2020 foi marcado pela recuperação do mercado de capitais brasileiro, com diversas companhias procedendo à realização de ofertas públicas de distribuição para captar recursos (por meio de IPOs ou follow-ons). A despeito de tal movimento ter sido interrompido pelos efeitos da pandemia do COVID-19, nota-se, nos últimos meses, uma retomada da procura do mercado de capitais, tanto por parte das companhias quanto pelos investidores, sobretudo em razão de uma baixa histórica da taxa de juros que torna o investimento em renda variável mais atrativo. Um dos diversos efeitos do ciclo expansionista do mercado de capitais é a ocorrência mais frequente de ofertas públicas de aquisição de ações por aumento de participação (“OPA por Aumento de Participação”), prevista no Art. 4º, §6º, da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976 (“LSA”), e no Art. 26 da Instrução CVM nº 361, de 5 de março de 2002 (“ICVM 361”).

A OPA por Aumento de Participação visa a garantir a liquidez dos acionistas minoritários de uma companhia aberta. Uma diminuição das ações disponíveis no mercado – que, consequentemente, dificulta a formação de participações acionárias relevantes para o exercício de determinados direitos – pode diminuir a possibilidade de o acionista minoritário vender suas ações e é este cenário que a OPA por Aumento de Participação visa a remediar[1].

Assim, na hipótese de o acionista controlador ou grupo de controladores (ou pessoas a ele vinculadas) aumentar sua participação de modo a adquirir mais de 1/3 do total das ações de cada espécie e classe em circulação[2], tal adquirente deverá lançar uma OPA por Aumento de Participação, por meio da qual compromete-se a adquirir, por um preço justo e que deve ser baseado em laudo de avaliação[3], todas as ações da classe ou da espécie afetada, se seus titulares desejarem vendê-las. Trata-se, em última análise, de um evento de liquidez legalmente concedido aos acionistas que venham a ter sua liquidez prejudicada.

A única alternativa para o controlador, caso ele não tenha o interesse em realizar a oferta pública mencionada acima, é solicitar à CVM a adoção do procedimento alternativo à OPA previsto no Art. 28 da ICVM 361, por meio do qual ele se comprometerá a alienar, no prazo de três meses a contar da data da aquisição das ações, o montante de ações que excedeu o limite legal, o qual, uma vez ultrapassado, há a obrigação de realizar a OPA por Aumento de Participação. É importante mencionar que a autarquia poderá, mediante requerimento, prorrogar uma única vez tal prazo para que as ações sejam alienadas, se for verificado que a alienação de todo o bloco no prazo inicial poderá afetar significativamente as cotações das ações.

Caso o acionista controlador decida realizar a OPA por Aumento de Participação, o preço oferecido poderá ser objeto de revisão, caso existam elementos de convicção que demonstrem ter havido falha ou imprecisão no emprego da metodologia de cálculo ou no critério de avaliação adotado para a definição do preço. Para tal, acionistas minoritários e que sejam titulares de, no mínimo, 10% das ações em circulação deverão fundamentadamente solicitar à administração da companhia emissora das ações objeto da OPA a realização de uma assembleia especial que irá deliberar sobre a realização de uma nova avaliação, na qual somente poderão votar os titulares das ações em circulação.

Por fim, na hipótese de a nova avaliação indicar um valor menor ou igual ao oferecido inicialmente, os acionistas minoritários que requereram a nova avaliação, bem como os que votaram pela sua realização deverão ressarcir a companhia. Se, contrariamente, o novo preço for maior que o original, o ofertante poderá dar continuidade à OPA por Aumento de Participação com o valor majorado ou optar pelo procedimento alternativo à OPA, deixando, portanto de realizar a OPA por Aumento de Participação e comprometendo-se a alienar o excesso de ações inicialmente adquiridas.


[1] Sem prejuízo da realização da OPA por Aumento de Participação, os níveis de listagem da B3 protegem a liquidez também ao exigirem um percentual mínimo de ações no free float.

[2] Consideram-se ações em circulação todas as ações de emissão da companhia, exceto as ações: (i) que compõem o bloco de controle; (ii) pertencentes a pessoas vinculadas aos controladores; (iii) pertencentes aos administradores da companhia; e (iv) presentes em tesouraria.

[3] O laudo de avaliação deverá ser elaborado pela instituição intermediária, sociedade corretora ou distribuidora de títulos e valores mobiliários ou instituição financeira com carteira de investimento que possuam área especializada e devidamente equipada e tiverem experiência comprovada, ou, ainda, por empresa especializada com experiência comprovada.

 

Eduardo Boulos
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Norlan Navarro
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Francisco Brandão
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