PANORAMA SOCIETÁRIO

Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo reforma decisão de primeira instância acerca de abuso do poder de controle

Em 21 de julho de 2020, a 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial (“2ª Câmara”) do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (“TJSP”) proveu parcialmente o recurso dos autores do processo judicial no. 1053084-94.2017.8.26.0100 requerendo, dentre outros pedidos, a anulação de deliberações de aprovação de contas tomadas em sede de assembleia geral de uma sociedade por ações (“Companhia”).

O pedido de anulação das deliberações teve por fundamento o argumento de abuso de controle por parte do acionista controlador, que também ocupa o cargo de diretor presidente da Companhia. Na posição de diretor presidente, o controlador efetuou diversos empréstimos a duas sociedades coligadas, bem como aprovou a prestação de garantias em favor de tais sociedades coligadas. Além disso, os autores demonstraram nos autos a existência de mútuos de valores relevantes sem a comprovação de contrapartida para a Companhia, a lavratura de uma escritura de emissão de debêntures de uma das sociedades coligadas em que a Companhia figura como uma das fiadoras e a prestação de avais em favor de tal sociedade coligada sem o oferecimento de qualquer garantia. Tais atos foram aprovados pelo diretor presidente em simples reuniões de diretoria da Companhia.

Os réus, por sua vez, afirmaram que o diretor presidente não exerce isoladamente o poder de administração ou de controle sobre a Companhia, tendo em vista que é apenas um dos quatros membros que compõem a diretoria e um dos acionistas da sociedade controladora. Acrescentaram que a orientação de voto para aprovação de contas da administração da Companhia é uma matéria de competência do conselho de administração, do qual o diretor não participa. Ainda, destacaram que as operações de mútuo e de garantia celebradas entre a Companhia e as demais empresas do grupo estão em consonância com a legislação aplicável, não estando configurado o abuso de poder.

A 2ª Câmara do TJSP acolheu os argumentos dos autores e utilizou como fundamentação para a decisão o parecer de um dos conselheiros fiscais da Companhia, não impugnado pelos réus, que aconselhava a não aprovação das contas do exercício de 2016, assim como as dos exercícios de 2013, 2014 e 2015. O parecer levantou os riscos referentes aos montantes dos avais concedidos para a garantia de operações de sociedades coligadas, bem como a falta de amortização de mútuos antigos concedidos à tais sociedades e o alto grau de endividamento da Companhia. Ainda, segundo o parecer, a existência de contrato de mútuo em valor superior a R$ 10 milhões, junto à sociedade controladora, existindo alto valor no saldo da reserva de lucros da Companhia, caracterizou uma distribuição disfarçada de lucros da Companhia aos seus controladores em detrimento dos demais acionistas.

Nas razões do voto, restou evidente a descapitalização da Companhia em favor de sua controladora e de sociedades coligadas, em razão de decisões tomadas em reuniões de diretoria, bem como o prejuízo causado aos acionistas minoritários. Dessa forma, deu-se provimento parcial aos pedidos do recurso de apelação para anular as deliberações das assembleias ocorridas em 07 de março de 2017 e 27 de março de 2017 pleiteadas pelos autores.

 

Luiz Eduardo Corradini
lcorradini@cascione.com.br

Isabela Franco
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