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Novidades Penais na Atividade Legislativa / 04.06.2021

PL 1960/2021

Autora: Luizianne Lins – PT/CE

Conteúdo: Acrescenta o §4º ao artigo 140 do Código Penal, como qualificadora do crime de injúria motivado em razão da condição de gênero feminino, através de misoginia:

“Art. 1º Esta lei acrescenta o §4º ao artigo 140 do Código Penal, Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, para qualificar o crime de injúria quando praticado através de misoginia, com a

seguinte redação:

Art. 140. …

§4º. Se a injúria for praticada através de meios, elementos ou conteúdos misóginos: Pena – reclusão de um a três anos e multa.”

Comentário: É importante notar que o §3º, do artigo 140, do Código Penal, trata da chamada “injúria racial”, que inclui não somente questões propriamente de raça, mas “na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência”. Sabe-se que as mulheres, assim como os grupos ali mencionados, também sofrem frequentemente com ofensas a seu decoro ou dignidade, em razão de sua condição de mulher. Nesse contexto, considerando também as proteções específicas à mulher existentes no ordenamento jurídico brasileiro, parece que a presente proposta vai no ensejo desse conjunto de tutelas penais. Se, por um lado, a medida é coerente com a proteção em questões de gênero, por outro, retoma crítica antiga quanto à expansão do direito penal.

 

PL 1906/2021

Autor: Eduardo Bismarck – PDT/CE

Conteúdo: Altera a Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal) para prever a doação dos aparelhos telefônicos apreendidos dentro dos estabelecimentos prisionais a alunos da rede pública de ensino. O PL altera o artigo 50 da Lei de Execução Penal, que contém as faltas graves, dentre as quais está a posse, o uso ou o fornecimento de aparelho telefônico, no inciso VIII, acrescentando o §§2º:

§2º Os aparelhos telefônicos apreendidos dentro dos estabelecimentos prisionais, após a elaboração do laudo pericial e sua juntada aos autos, quando não interessarem à persecução penal, ou quando não vinculados a efeito ou a investigação específica, serão encaminhados pelo juiz competente à rede pública de ensino para doação a estudantes em situação de vulnerabilidade social.

I – A rede pública de ensino que optar pelo recebimento desses aparelhos telefônicos deverá firmar Termo de Compromisso se obrigando a realizar a sua completa restauração;

II – Além da restauração, a rede pública de ensino que optar pelo recebimento de aparelhos telefônicos com avarias deverá se responsabilizar pela sua reparação para que fique em condições de uso.

Comentário: Segundo o proponente, a medida se destinaria a possibilitar que alunos da rede pública de ensino acessassem suas aulas online durante a pandemia. O Deputado afirma que os aparelhos celulares apreendidos são sucateados, tornando-se lixo, e que a medida já foi aplicada, sem lei específica para tanto, nos Estados do Ceará e do Rio Grande do Sul.

Embora bem-intencionado, o projeto, na verdade, não dá solução ao problema do estudante da rede pública de ensino que não tem acesso às aulas remotas.

No ano passado, o Ministério da Educação (MEC), por meio de ofício, afirmou não ter ciência do número de alunos da rede pública de ensino tendo aulas online. No Estado do Acre, onde tais números foram apurados, descobriu-se que seriam cerca de 148.000 alunos, no início de 2021. Considerando que a população no Estado de São Paulo é cerca de 45 vezes maior que a do Acre, é lógico afirmar que, aqui, o número de alunos é muito maior. Pelas estimativas do DataSenado, realizadas em agosto de 2020, há 32,4 milhões de alunos, nas redes pública e particular, em regime de teleaulas. Ainda de acordo com essa estimativa, 26% dos alunos da rede pública no Brasil não têm sequer acesso à internet.

Os números de celulares apreendidos em presídios, embora possam parecer alarmantes quando colocados isoladamente na justificação dos PLs, são ínfimos perto da quantidade de alunos da rede pública de ensino. No ano de 2017, foram apreendidos 14.417 celulares nos presídios do Estado de São Paulo. No Estado do Ceará, foram 6.300 celulares apreendidos em 2019.

Nesse sentido, o PL não resolve problemas práticos, como qual seria o meio de entrega dos celulares aos alunos pela rede pública de ensino, ou como seria feito para manter um controle dos aparelhos recebidos pelos alunos ou o que ocorreria se um aluno danificasse o celular recebido – afinal, o celular pertenceria à rede pública, sendo apenas emprestado ao aluno, ou seria doado a ele, para que fizesse o que bem entender?

Assim, o projeto apresenta medida carismática, seja pelo aspecto de que os celulares seriam provenientes de apreensão em delegacia, seja por, em tese, favorecer estudantes da rede pública. Ocorre que o problema do ensino remoto, no Brasil, é mais complexo e cobra soluções cujo sentido não sugira um improviso contra fatos estruturais.