AUTORES: Lídice da Mata – PSB/BA e outros.
CONTEÚDO: Altera o Código de Processo Penal para dispor sobre a audiência de instrução e julgamento nos casos de crimes contra a dignidade sexual
O Projeto de Lei nº 5096/2020 prevê o acréscimo do art. 400-A ao Código de Processo Penal, para que as partes presentes durante as audiências de instrução e julgamento nos crimes contra a dignidade sexual zelem pela integridade física e psicológica da vítima. Outros projetos recentes também ensejam alterações no Código de Processo Penal, a fim de garantir o tratamento digno das vítimas de crimes sexuais em juízo, como o PL 5117, do Senador Fabiano Contarato, e o PL 5144, da deputada Flávia Morais.
O tema recorrente nos projetos de lei supracitados se deve à repercussão nacional que teve a matéria publicada pelo jornal The Intercept Brasil, referente à absolvição do empresário André de Camargo Aranha no processo de estupro que enfrentou. A suposta vítima, Mariana Ferrer, alega ter sido estuprada em uma festa em 2018, pois encontrava-se dopada e não tinha condições de consentir a relação. Um dos principais fatores pela repercussão do caso foi o tratamento dado a vítima pelo advogado da defesa, Cláudio Gastão da Rosa Filho, durante a audiência de instrução.
Dessa forma, observa-se a intenção do legislador de impedir que novos casos de humilhação de vítimas de crimes contra a dignidade sexual ocorram durante as audiências judiciais, a fim de evitar a exposição de indivíduos já vulnerados e a vitimização secundária desses.
Não obstante a aparente louvável intenção do legislador, o tratamento digno das partes, inclusive das vítimas de crimes sexuais em juízo, pode ser extraído dos princípios constitucionais da dignidade humana, da cidadania e da vedação a qualquer forma de discriminação. Além disso, a postura ética e respeitosa do advogado já é exigida pelo Código de Ética e Disciplina da OAB. Evidencia-se, portanto, o uso (cada vez mais recorrente) do direito penal simbólico como meio para fornecer uma resposta favorável aos clamores populares, contrariando o princípio do direito penal mínimo.
AUTORA: Daniela do Waguinho – MDB/RJ
CONTEÚDO: Altera o Art. 217-A do Código Penal, para aumentar a pena do crime de estupro de vulnerável de 8-15 anos (redação atual) para 10-20 anos.
O Projeto de Lei apresentado pela deputada Daniela do Waguinho não é o único projeto recente a prever o recrudescimento penal dos crimes contra a dignidade sexual, outros como o PL 5101/2020 e o PL 5102/2020, ambos de autoria de Guiga Peixoto- PSL/SP, também estabelecem penas mais rigorosas aos réus desses delitos.
Tais iniciativas legislativas são motivadas da mesma forma que as primeiras aqui discutidas no Panorama do Direito Penal, isto é, são reações a grande repercussão midiática que teve o caso da Mariana Ferrer. Todavia, os primeiros projetos de lei objetivam o tratamento digno das vítimas de crimes contra a dignidade sexual durante os atos do processo penal, mas o PL 5095/2020 e seus similares buscam o simples tratamento penal mais rigoroso a esses delitos, valendo-se, inclusive, de medidas claramente inconstitucionais, como o PL 5102/2020 que torna imprescritível o crime de estupro de vulnerável. Assim, mais uma vez se presencia a influência do senso comum e do debate punitivista sobre o legislador, fazendo com que esse deixe de observar os fundamentos do Direito Penal, como a prescrição das penas, que é habitualmente confundida com impunidade, mas, na verdade, dá celeridade ao processo e impede a ineficiência do Estado.
AUTOR: Bia Kicis – PSL/DF
CONTEÚDO: Altera a redação do parágrafo único do artigo 83 do Código Penal, para que a concessão do livramento do condenado por crime doloso cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, fique também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinquir. Ademais, nos casos dos crimes contra a liberdade sexual, somente poderá ser concedido se o condenado já tiver concluído, com resultado satisfatório, tratamento químico voluntário para inibição do desejo sexual. Por fim, o projeto prevê o recrudescimento penal dos tipos previstos nos arts. 213 e 217-A do CP.
Observa-se, novamente, tentativas de dificultar a concessão do livramento condicional, que antes do advento do Pacto Anticrime poderia ser concedido, entre outros requisitos, àqueles que apresentassem comportamento satisfatório durante a execução da pena. O comportamento satisfatório era constatado pela ausência de faltas graves durante a execução da pena. Com a vigência do Pacote Anticrime, tornou-se necessário para o livramento condicional o bom comportamento do preso durante a execução penal, bem como o não cometimento de falta grave nos últimos 12 meses. Mudanças sutis, mas que aumentam a discricionaridade das autoridades públicas ao conceder o benefício do livramento.
Dessa forma, o PL 5112/2020 condiciona o livramento aos condenados por crimes contra a dignidade sexual ao tratamento químico voluntário para inibição de desejo sexual, bem como estabelece regimes de penas mais rigorosos aos arts. 213 e 217-A do Código Penal. Presencia-se, outra vez, o legislador flertando com o clamor público após a repercussão do caso Mariana Ferrer e aumentando as penas dos crimes contra a liberdade sexual.
Todavia, no caso singular do PL 5112/2020, ao se exigir o tratamento químico voluntário para inibição de desejo sexual, comete-se o erro de presumir que a alteração hormonal do condenado por crime contra a dignidade sexual impedirá que esse volte a delinquir, visto que esses crimes ocorrem, não por um impulso sexual provocado pelos hormônios, mas por uma relação de dominação entre o criminoso e a vítima. A violência sexual não depende da conjunção carnal, podendo ser consumada por diversos meios que ofendam a dignidade sexual da vítima, pois trata-se de uma relação de poder e de submissão da vítima ao agressor.
Autor: Daniel Silveira – PSL/RJ
Conteúdo: Dispõe sobre o dever do advogado e de seu cliente quanto à declaração de origem lícita dos valores utilizados para o pagamento de honorários advocatícios e da fiança na persecução penal. Dessa forma, altera-se o art. 180 do CP para que também incorra o advogado que recebe honorários advocatícios cujos valores sabe terem origem ilícita. Altera-se, também, o art. 330 do CPP, para que seja comprovada a origem lícita do depósito de fianças, e o art. 5º da Lei 8.906/94, para que no instrumento de mandato conste a declaração de licitude e da procedência dos recursos empregados para o pagamento dos honorários advocatícios.
O PL 5124/2020 muito se assemelha ao PL 3789/2019, de autoria do mesmo partido, equiparando o advogado que recebe honorários advocatícios cujos valores sabe terem origem ilícita ao delito de receptação, bem como exige-se a comprovação de origem lícita do depósito de fianças.
Em primeiro lugar, a exigência de prova da licitude da fiança implica em inversão do ônus da prova da acusação para a defesa, representando direta afronta ao princípio constitucional da presunção de inocência. Além disso, tais alterações somente agravariam a seletividade penal, pois é notório que a maioria indivíduos processados criminalmente são de baixa renda e que, usualmente, vivem na informalidade, tendo maior dificuldade para comprovar a fonte de renda..
Ademais, ao equiparar advogados que recebem honorários advocatícios cujos valores sabem terem origem ilícita ao crime de receptação, atenta-se ao princípio do livre exercício da profissão, bem como ao princípio da ampla defesa e do contraditório.