PANORAMA SOCIETÁRIO

Sancionada lei que cria o voto plural no Brasil

Em 26 de agosto de 2021, foi sancionada pelo Presidente da República a Lei nº 14.195/2021 (“Lei 14.195”), originada pela Medida Provisória nº 1.040, publicada no dia 30 de março de 2021 com o intuito de melhorar o ambiente de negócios brasileiro por meio de alterações legislativas visando a elevar a posição do Brasil no ranking Doing Business, criado e organizado pelo Banco Mundial.

A Lei 14.195 alterou diversos pontos relevantes da Lei 6.404/1976 (“Lei das S.A.”), tais como (i) a inclusão de novas matérias de competência exclusiva da assembleia geral, (ii) o aumento do prazo de convocação das assembleias gerais de companhias abertas, (iii) alterações de regras aplicáveis ao conselho de administração de companhias abertas (i. e. a vedação do acúmulo de cargos de presidente do conselho de administração e do cargo de diretor-presidente ou de principal executivo da companhia e obrigação da participação de conselheiros independentes) e (iv) a possibilidade da eleição de diretores não residentes no Brasil, que serão abordados em próximos textos de nosso Panorama Societário. Não obstante a relevância de tais pontos, a alteração mais importante na Lei das S,A. é a permissão para que companhias adotem o voto plural, isto é, a possibilidade de emissão de ações ordinárias com direito a mais de um voto por ação.

Admissão e criação

A adoção do voto plural é admitida nas companhias fechadas ou abertas, desde que a criação da classe ocorra previamente à negociação de ações ou valores mobiliários conversíveis em mercados organizados de valores mobiliários, ficando vedada a alteração das características das ações após o início da negociação no mercado. Também ficou vedada a adoção do voto plural pelas empresas públicas, sociedades de economia mista e suas subsidiárias e sociedades controladas direta ou indiretamente pelo poder público.

A criação da classe de ações ordinárias com voto múltiplo depende do voto favorável de, pelo menos, (i) metade do total de votos conferidos pelas ações com direito a voto; e (ii) metade das ações preferenciais sem direito a voto ou com voto restrito, se emitidas, reunidas em assembleia especial, podendo o estatuto social exigir quórum maior. Os acionistas dissidentes da deliberação podem exercer o seu direito de retirada, com o reembolso do valor de suas ações.

Ficam também vedadas as operações de incorporação, incorporação de ações ou fusão de companhia aberta que não adote voto plural em companhia que adote voto plural. Da mesma forma, a Lei 14.195 vedou a cisão de companhia aberta que não adote voto plural, para a constituição de nova companhia adotando o voto plural, ou incorporação da parcela cindida em companhia que o adote.

Vigência

O voto plural deve ter um prazo máximo de vigência inicial de 7 anos, sendo prorrogável pela assembleia geral, desde que que seja observado o quórum exigido para a criação da classe de ações descrito acima. Nessa votação, deve-se excluir o voto dos titulares das ações ordinárias com voto plural cuja prorrogação da vigência seja objeto da deliberação. Além disso, fica assegurado o direito de retiradas dos acionistas dissidentes.

Também é facultado aos acionistas estipularem o fim da vigência do voto plural condicionado a evento ou termo, desde que sejam observados os demais requisitos (i. e. prazo de vigência inicial máximo de 7 anos e demais regras de transferência).

A Lei 14.195 também estabeleceu a conversão automáticas dessas ações em ações ordinárias sem voto plural nos seguintes casos: (i) transferência dessas ações a terceiros, a qualquer título, exceto se (a) o alienante permanecer indiretamente como único titular das ações e no controle dos direitos políticos conferidos por elas; (b) o terceiro já for titular de ações da mesma classe daquelas a ele transferidas; ou (c) a transferência ocorrer no regime de titularidade fiduciária para fins de constituição do depósito centralizado; ou (ii) de acordo de acionistas entre titulares de ações com voto plural e acionistas sem essa classe de ações, e que disponha sobre exercício conjunto de voto.

Limitações

A Lei 14.195 estabeleceu o limite, para as ações ordinárias com voto plural, de até 10 (dez) votos por ação em relação às demais ações ordinárias sem voto plural. O voto plural também não será adotado nas assembleias que deliberarem sobre: (i) a remuneração de administradores; e (b) a celebração de transações com partes relacionadas que atendam aos critérios de relevância a serem definidos pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

 

Eduardo Boulos
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Luiz Eduardo Corradini
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Lucas Markan
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Carolina Toledo
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