Adquirir

TJ/SP declara nula holding familiar criada para excluir herdeira

 

A 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, ao julgar recursos interpostos em ação envolvendo planejamento sucessório e direito hereditário, decidiu, por unanimidade, declarar a nulidade da constituição de holding familiar criada pelo patriarca pouco antes de seu falecimento, reconhecendo tratar-se de negócio simulado destinado a fraudar a legítima e excluir uma das filhas da sucessão, com determinação de retorno dos bens ao espólio.

A controvérsia teve origem em ação proposta por uma das herdeiras, que alegou que o pai, já enfermo e próximo do falecimento, constituiu uma holding familiar para transferir seus bens pessoais, excluindo a autora do quadro societário e, indiretamente, de parcela de sua herança. Alegou-se que o ato societário teria sido praticado de forma simulada, com o propósito de burlar a legítima assegurada à herdeira necessária. Os réus, por sua vez, sustentaram que a operação integrava um legítimo projeto de organização patrimonial e planejamento sucessório. O juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedente o pedido, reconhecendo irregularidades na constituição da sociedade, o que levou ambas as partes a recorrerem.

Na apreciação dos recursos, o relator, desembargador Ênio Santarelli Zuliani, embora tenha reconhecido a utilização de holdings familiares como prática admitida como instrumento de planejamento sucessório, tais estruturas não podem servir à supressão de direitos de herdeiros necessários ou contornar a ordem da vocação hereditária. O magistrado destacou que, no caso, restou evidenciada a simulação do negócio jurídico e o desvio de finalidade da pessoa jurídica, em afronta aos artigos 1.784, 1.846 e 1.847 do Código Civil, que consagram, respectivamente, a transmissão automática da herança – droit de saisine – e a igualdade entre os herdeiros necessários na fruição da legítima.

No caso concreto, entendeu-se que a constituição da holding em momento muito próximo ao falecimento do patriarca, sem a participação de todos os herdeiros e com a exclusão específica da autora, aliada à ausência de prova efetiva de que ela tivesse acesso aos resultados de eventual participação societária, revelava a intenção de afastá-la da sucessão. Diante desse conjunto probatório, o colegiado concluiu pela existência de fraude à legítima, declarou nula a constituição da holding e as alterações contratuais correlatas e determinou o retorno dos bens ao espólio, como forma de recompor a massa hereditária e viabilizar a partilha conforme as regras sucessórias vigentes.

A decisão reforça a legitimidade do planejamento sucessório via holding familiar, limitando-a, porém, na proteção da legítima e na igualdade entre herdeiros necessários, não se admitindo o uso da forma societária como mecanismo de exclusão velada de sucessores. Com isso, o TJ/SP sinaliza que, tal como qualquer outra empresa, as holdings familiares poderão ser responsabilizadas ou desconstituídas, quando utilizadas em simulação ou desvio de finalidade – nesse caso, especificamente em relação à reconhecida fraude ao direito sucessório.


Link: Processo em Segredo de Justiça.