PANORAMA SOCIETÁRIO

Os prejuízos do exercício e o pagamento de dividendos

O pagamento de dividendos sempre foi um importante atrativo aos investidores. Na atual conjuntura econômica, marcada pelos baixos níveis da taxa básica de juros no Brasil, a distribuição de dividendos tem se tornado mais relevante para os investidores e, consequentemente, para as companhias.

Deve-se ressaltar, contudo, que a mera existência de lucros ou de reserva de lucros não autoriza a administração das companhias a propor a distribuição dos dividendos. Nos termos do Art. 189, parágrafo único, da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976 (“LSA”), o prejuízo do exercício será obrigatoriamente absorvido pelos lucros acumulados, pelas reservas de lucros e pela reserva legal, nessa ordem. Em outras palavras, não é possível que uma companhia pague dividendos à conta de lucro líquido do exercício, de lucros acumulados e/ou de reserva de lucros, quando os referidos lucros ou as referidas reservas não forem suficientes para absorver os prejuízos apurados no exercício.

Em decisão recente[1], a Comissão de Valores Mobiliários aplicou multa pecuniária aos diretores que elaboraram e submeteram à assembleia a proposta da administração de distribuição de dividendos sem contrapartida em resultado do exercício ou reservas existentes e sem menção à obrigatoriedade de absorção do prejuízo do exercício pelos lucros acumulados, pelas reservas de lucros e pela reserva legal.

Nos casos em que não é possível distribuir dividendos à conta de lucros acumulados, reservas de lucros ou reserva legal, uma alternativa que já tivemos a oportunidade de destacar é a distribuição de dividendos à conta de reserva de capital (clique aqui para acessar). Para tal, devem ser emitidas ações preferenciais com prioridade na distribuição de dividendo cumulativo e que podem pagar dividendos à conta das reservas de capital formada pelo ágio na subscrição de ações e pelo preço de emissão de partes beneficiárias e bônus de subscrição (Arts. 17, §6º, 182, §1º e §2º e 201 da LSA).

Por fim, uma ferramenta que tem sido adotada por companhias brasileiras é a criação da chamada reserva para equalização de dividendos, que visa a estabelecer um fluxo de pagamento de dividendos, de modo a garantir ao acionista maior previsibilidade com relação ao retorno de seu investimento. Esta reserva de lucros deverá ser criada nos termos do Art. 194 da LSA, i.e., o estatuto deverá indicar (i) a sua finalidade, (ii) os critérios fixados para determinar a parcela anual dos lucros líquidos que serão destinados à sua constituição e (iii) o seu limite máximo. É importante mencionar que os dividendos pagos à conta da reserva para equalização de dividendos também estão sujeitos à regra do Art. 189 da LSA mencionada acima e poderão, se necessário, absorver o prejuízo do exercício.


[1] PAS CVM SEI nº 19957.004730/2016-84 (RJ2016/6169), julgado em 6 de outubro de 2020, de relatoria da Diretora Flávia Perlingeiro. Disponível em: <http://www.cvm.gov.br/noticias/arquivos/2020/20201006-1.html>. Acessado em 14 de outubro de 2020.

 

Eduardo Boulos
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Maximilian Fritz
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