Na 251ª Sessão Ordinária de Julgamento (“SOJ”), o Tribunal do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (“CADE”) analisou consulta de fabricante de pneus sobre a licitude de potencial fixação dos preços mínimos anunciados (“PMA”) pelos seus revendedores.
O Conselheiro Relator Diogo Thomson considerou que a PMA possui relevante potencial anticompetitivo e deve ser tratada como ilícito por objeto, com presunção relativa de ilicitude e inversão do ônus da prova, cabendo à empresa demonstrar a ausência de problemas concorrenciais.
No caso, o Tribunal entendeu não ser possível avaliar esses elementos em sede de consulta e, por unanimidade, indeferiu a política proposta. Ademais, determinou que a Superintendência-Geral do CADE (“SG”) oficiasse os principais fabricantes de pneus no Brasil para ciência da decisão.
Na 251ª SOJ, o Tribunal do CADE condenou, por unanimidade, um sindicato do setor hospitalar por supostamente influenciar a adoção de conduta comercial uniforme. Conforme o Conselheiro Relator Diogo Thomson, os contratos-modelo divulgados no site do sindicato, com preços de medicamentos e materiais hospitalares baseados em tabelas de revistas especializadas, tenderiam a alinhar a conduta dos seus associados.
O Tribunal assinalou que o tabelamento de preços é presumidamente ilícito, de forma que caberia ao representado demonstrar poder compensatório na relação entre associados e operadoras de planos de saúde, com quem os contratos-modelos seriam celebrados, e/ou imunidade antitruste decorrente de regulação pública. Contudo, nenhuma dessas exceções teria sido comprovada. Embora os contratos-modelo não fossem de adoção obrigatória, sua simples disponibilização já seria capaz de gerar efeitos anticompetitivos.
Este foi o sexto caso julgado pelo Tribunal em 2025 envolvendo associações, sindicatos, cooperativas e conselhos profissionais, todos resultando em condenações unânimes.
Em agosto, a SG conheceu e aprovou ato de concentração referente a novo acordo de acionistas de uma farmacêutica, por meio do qual uma acionista minoritária, que havia adquirido 11% do capital social da empresa em março, foi incluída no bloco de controle. A acionista atua no setor de materiais de construção e não possui atividades no mercado farmacêutico, motivo pelo qual somente estaria obrigada a notificar ao CADE caso atingisse 20% de participação ou adquirisse controle total ou compartilhado.
Para a SG, embora a aquisição de capital social inicial não fosse notificável, a posterior inclusão da acionista minoritária no bloco de controle por meio do acordo de acionistas, mesmo sem alteração da participação societária, teria alterado os moldes da operação inicial, configurando-a como aquisição de controle e exigindo notificação prévia ao CADE.
O CADE definiu o setor de combustíveis líquidos como prioridade de atuação para os anos de 2025 e 2026, conforme Portaria nº 379/2025 do Presidente Gustavo Augusto.
A medida traz implicações práticas relevantes: (i) a SG deverá priorizar investigações no setor; (ii) o DEE deverá atualizar estudos e propor novas iniciativas pró-concorrenciais para o setor; (iii) o CADE deverá intensificar a interlocução com outras áreas do governo, especialmente a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (“ANP”) e a Receita Federal; (iv) será realizada audiência pública para identificar problemas concorrenciais no setor; e (v) será lançada campanha institucional para incentivar o uso do “clique denúncia” e divulgar o programa de leniência.
A audiência pública já foi convocada e ocorrerá em novembro, reunindo representantes do setor privado, do governo, da academia e da sociedade civil.
Em setembro, o CADE publicou a nova versão do Guia de Leniência Antitruste, que consolida os procedimentos para negociação e execução de acordos de leniência em casos de condutas anticompetitivas entre concorrentes.
Como principais mudanças, destaca-se: (i) exemplos práticos de infrações à ordem econômica que podem ser objeto de acordo de leniência que incluem condutas envolvendo o mercado de trabalho (como no-poach e wage-fixing), bem como troca de informações sensíveis envolvendo quaisquer “variáveis que reduzam a incerteza e/ou permitam a coordenação entre concorrentes”, inclusive no âmbito de acordos de cooperação técnica e P&D etc.; (ii) criação de fase opcional e prévia ao pedido oficial de marker para apresentação de dúvidas e avaliação da viabilidade do acordo; (iii) intensificação da cooperação institucional entre CADE, Controladoria-Geral da União (“CGU”) e Advocacia Geral da União (“AGU”) em casos de cartel em licitações públicas; e (iv) detalhamento de regras sobre leniência parcial, incluindo a possibilidade de ajuste da dosimetria das multas aplicadas pelo CADE em função de sanções aplicadas por outros órgãos.
Durante a 252ª SOJ, o Tribunal do CADE aprovou, por unanimidade e sem restrições, a criação de uma joint venture entre duas distribuidoras de Gás Liquefeito de Petróleo (“GLP”) para construção, desenvolvimento e operação de terminal portuário no Complexo Industrial e Portuário do Pecém, no Ceará. A operação foi levada ao Tribunal do CADE após recurso de concorrente, que levantou preocupações sobre possível fechamento do terminal a terceiros.
Em sua decisão, o Tribunal do CADE concluiu que a operação poderia ser aprovada diante de compromissos assumidos pelas partes e da regulação setorial da ANP: (i) abertura do terminal a terceiros; (ii) tratamento isonômico e não discriminatório aos concorrentes; (iii) estrutura de governança independente para gestão da joint venture; (iv) garantia de condições logísticas para recebimento e armazenamento de GLP; e (v) possibilidade de interconexão com as instalações do terminal.
Na 253ª SOJ, o Tribunal do CADE arquivou investigação de gun jumping instaurada para apurar a eventual consumação irregular de contrato de codeshare entre duas companhias aéreas. Embora não tenha sido identificada infração à ordem econômica, o Tribunal determinou a notificação do contrato por entender que haveria interesse público em sua avaliação pela autoridade antitruste.
O Conselheiro Relator Carlos Jacques destacou que, embora contratos de codeshare sejam associativos, não houve gun jumping, pois o contrato tinha prazo indeterminado e a obrigatoriedade de notificação apenas surgiria ao atingir dois anos de vigência. O caso levou o Tribunal do CADE a discutir a eventual revisão dos critérios de notificação de contratos associativos, diante do alegado risco de implementação de contratos relevantes sem análise antitruste prévia.
Na 253ª SOJ, o Tribunal do CADE, por unanimidade, revisou multa aplicada em 2021 contra empresa de transporte logístico por suposto abuso de posição dominante. O Tribunal Regional Federal da 1ª Região anulou a decisão condenatória ao entender que a dosimetria teria sido desproporcional, pois considerou o faturamento de todas as atividades da empresa e não apenas o mercado afetado.
Concordando com a desproporcionalidade da multa original, o Tribunal homologou acordo proposto pela empresa. Por meio de base de cálculo mais restrita, a multa foi reduzida de R$ 250 milhões para R$ 18 milhões.
Abertura de Investigações e Revisões: Foram iniciadas as seguintes investigações e revisões de medidas de defesa comercial pela Secretaria de Comércio Exterior (“SECEX”).
Investigação original de dumping nas importações de fibras de vidro do tipo roving oriundas da China e do Egito
Investigação pleiteada pela principal produtora nacional, a Owens Corning, com o apoio da CPIC Brasil. O pleito originalmente buscava investigar as exportações chinesas e, posteriormente, a indústria nacional solicitou a inclusão do Egito como origem investigada.
Revisão de final de período do direito antidumping aplicado às importações de PVC-S oriundo da China
A terceira revisão de final de período foi solicitada pelas produtoras nacionais, Braskem e Unipar, e se fundamentará principalmente na retomada do dumping e do dano diante de volume não representativo das importações investigadas.
Avaliação de Interesse Público (AIP) do direito antidumping aplicado às importações de aço GNO oriundo da Alemanha, China, Coreia do Sul e Taipé Chinês
A AIP foi iniciada ex officio pela SECEX por indicação da CAMEX realizada juntamente com a aprovação da primeira renovação do direito antidumping (esta é a segunda AIP iniciada por orientação da CAMEX).
Determinações preliminares: A SECEX publicou determinações preliminares em duas investigações de dumping atualmente em curso e que tiveram conclusões e desfechos muito distintos.
Leite em pó oriundo da Argentina e do Uruguai
O pleito foi apresentado pela indústria brasileira de leite in natura, representada pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). A SECEX concluiu que, havendo produção nacional de leite em pó (produto idêntico), não seria possível analisar o dano a partir de dados somente da indústria de produto similar (leite in natura). Ainda assim, investigação foi mantida aberta, sem aplicação de direito provisório, ao menos até a Nota Técnica de Fatos Essenciais.
Resinas de polietileno oriundas dos EUA e Canadá
Após determinação preliminar positiva da SECEX com recomendação de aplicação de direito provisório devido à continuidade das importações investigadas, a Câmara de Comércio Exterior (CAMEX) decidiu pela aplicação da medida provisória, por um período de 6 meses, e redução de 10% das margens calculadas.
Conclusão de Investigações e Aplicação de Medidas: Duas investigações originais foram concluídas com a publicação de decisão final pela CAMEX.
Fibras sintéticas de poliéster
A CAMEX aplicou direito antidumping definitivo às importações oriundas da China, Índia, Tailândia e Vietnã, com alíquotas específicas entre US$ 74,98/t e US$ 390,94/t. A SECEX encerrou a investigação contra as importações da Malásia por não ter sido comprovada a prática de dumping.
Folhas metálicas de aço carbono
A CAMEX aplicou direito antidumping definitivo às importações oriundas da China, com alíquotas específicas entre US$ 284,34/t e US$ 499,35/t.
Encerramento de investigação: A SECEX publicou o encerramento de uma investigação original.
Nebulizadores oriundos da China
A investigação original, iniciada em maio de 2024, teve determinação preliminar positiva e aplicação de direito provisório por nove meses, e já se encontrava em fase de elaboração de Nota Técnica de Fatos Essenciais. O encerramento ocorreu a pedido do peticionário.
Alteração da Regulamentação da Avaliação de Interesse Público
A SECEX atualizou a regulamentação dos procedimentos administrativos de avaliação de interesse público em medidas antidumping e compensatórias para permitir que os prazos de duração da fase probatória e apresentação de manifestações finais possam ser prorrogados pelo Departamento de Defesa Comercial (“DECOM”).
O Tarifaço Norte-Americano e as Medidas do Governo Brasileiro: No último mês, o Governo adotou uma série de medidas de resposta e de apoio à indústria nacional, em resposta às diversas tarifas impostas pelo EUA com efeito sobre as exportações brasileiras.
Governo inicia análise para aplicar Lei da Reciprocidade
O Ministério das Relações Exteriores (MRE) solicitou que a Secretaria-Executiva da CAMEX elabore relatório sobre a possibilidade de uso da Lei da Reciprocidade contra as tarifas excepcionais aplicadas pelos EUA. Caso seja aprovado um relatório com conclusão positiva para o uso da Lei, um grupo interministerial será instituído para elaborar a proposta de contramedidas a serem adotadas.
Pedido de Consulta na Organização Mundial do Comércio (OMC)
O Brasil apresentou à OMC um pedido de consulta com os EUA, no âmbito do Sistema de Solução de Controvérsias, acerca das tarifas recíprocas e investigação da Seção 301 que afetam ou podem afetar as exportações brasileiras. O processo de consultas busca permitir negociações entre as partes antes que seja dado início a um processo contencioso na Organização.
Governo brasileiro lança Plano Brasil Soberano
O Governo do Brasil anunciou uma série de medidas com o objetivo de mitigar os impactos econômicos das tarifas impostas pelos EUA. As ações estão separadas em três eixos: fortalecimento do setor produtivo, proteção aos trabalhadores, e diplomacia comercial e multilateralismo. Estão previstas linhas de crédito e diferimento tributário, criação de uma Câmara para monitoramento dos níveis de emprego e proposição de medidas, além do reforço no diálogo com os EUA e outros parceiros.
Prorrogação do prazo de drawback para empresas afetadas pelo tarifaço
Dentro do Plano Brasil Soberano, a SECEX regulamentou a prorrogação por um ano do prazo de desoneração tributária do drawback suspensão para os casos de compromissos de exportação afetados pelas tarifas dos EUA. O interesse no uso do benefício deve ser comunicado previamente ao MDIC.
Denise Junqueira
Direito Concorrencial e Comércio Internacional
djunqueira@cascione.com.br